Jornal Pires Rural - Há 13 anos revelando a agricultura familiar

segunda-feira, 24 de junho de 2013

Renda extra com o milho pode gerar dívida

A cultura do milho, em nossa região, toma espaço de pequenas áreas na época das chuvas. É bem vinda para garantir uma renda a mais para o agricultor e ao mesmo tempo é um lance do jogo de xadrez que o produtor tem que fazer para continuar rentável sua propriedade. O agrônomo José Fernando Martins Borges, especialista em genética vegetal, desenvolveu sua própria variedade de milho, e com isso o agricultor tem outras opções de sementes para escolher na hora do plantio, ao invés de ficar nas mãos de grandes corporações agroindustriais que na maioria das vezes são empresas internacionais. Há de suspeitar que essas empresas possam abastecer o mercado brasileiro com experiências já obsoletas ou mesmo sucateadas em seus países de origem.
Na entrevista que fizemos com o pesquisador José Fernando, ele abordou um pouco sobre seu trabalho contínuo de pesquisa, a parceira que tem com institutos de pesquisa e principalmente com o agricultor, falou também sua avaliação ante o mercado de milho local, dizendo que o milho é um cultura apenas sazonal em nossa região, onde ocupa pequenos espaço nas propriedades tendo um plano secundário para o produtor. Leia a seguir trechos da entrevista;

JPR: Em relação aos preços da safra 2011/20, qual foi a média da saca pra nossa região?
José Fernando Os preços variaram pouco, ficou entre R$18,00 a R$22,00 a saca para quem trabalha na lavoura e pra quem armazena já teve preço mais alto. Acredito que para a safra 2012/2013 possa melhorar, mas vai continuar abaixo das expectativas. O interessante seria que ficasse em R$30,00 que estão pagando agora porque não tem milho, a colheita ainda não começou. Devido a chuva aparecer um pouco atrasada o plantio do milho veio tarde, porém isso não vai afetar a produção, pois o clima esta muito bom e a produção vai ser normal.

JPR:Em relação ao volume de produção da nossa região?
José Fernando A safra foi boa na colheita passada e tenho certeza que esse clima e as chuvas constantes ajudarão numa excelente colheita esse ano também.

JPR:Houve alguma interferência na safra do milho no ano passado?
José Fernando O ano passado teve uma seca forte no Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, mas esse ano está normal eles terão uma safra muito boa. E para nós o ano passado na colheita do milho tarde a carga de chuva foi grande, atrapalhou um pouco a colheita, porém teve uma produção excelente.

JPR:Você citou que o preço de R$30,00 seria bom, mas o mercado reclama que esse valor é alto?
José Fernando Não é um preço alto. O pessoal de aves e suínos reclama desse valor porque eles vendem muito barato seus produtos. No geral os preços dos produtos agrícolas estão baixos, precisava ter um preço melhor para o produtor.

JPR:De quem é a culpa por esses preços tão baixos?
José Fernando A culpa é de todos. Existe uma pressão do governo no interesse de manter a inflação baixa e ter comida barata. Por outro lado, o agricultor não valoriza seu produto, na hora da venda parece que ele quer se livrar da sua produção. Ele não estipula o quanto quer ganhar, ele pergunta: quanto vão me dar? Sem planejamento fica refém dessa situação. As grandes empresas de insumos têm uma participação grande nessa questão, quando financiam a produção, de certos agricultores, para que possam pagar na colheita. Só que depois da colheita o preço do produto é estipulado pelas empresas que financiaram a lavoura, o produtor nem abre a boca. Isso acontece principalmente no plantio de sementes transgênicas quem vem no pacote juntamente com o adubo e os defensivos. O agricultor vira um empregado de empresas multinacionais.

JPR: Por qual razão o agricultor deixa-se levar por uma situação dessas?
José Fernando A descapitalização. O acumulo de dívidas e sem dinheiro para plantar, as empresas oferecem o “pacote”, ele aceita, talvez ache que será uma saída para ter renda. Isso aumenta a produção e na hora da colheita o preço cai lá embaixo. O interesse das empresas é esse quem tenha bastante produção e preço baixo.

JPR:As sementes transgênicas colaboraram para essa situação e essas práticas também acontecem em nossa região?
José Fernando Sim, tanto um quanto o outro. As cooperativas são como agentes dessas empresas, que abastecem de sementes transgênicas, adubos e fertilizantes as cooperativas e essas trazem os agricultores. No meu caso eu não faço dessa forma. Prefiro fazer com dinheiro próprio o que é possível, e se não for não faço, pra não ficar empenhado com esses financiamentos, pois gera um contrato bem feroz, com hipoteca das terras, das máquinas, todo ano fica hipotecado e se a produção falhar tem que pagar do mesmo jeito.

JPR:Você acredita que o produtor brasileiro não está preparado para questionar e exigir mais garantias e melhor renda?
José Fernando É a força dessas empresas multinacionais aqui é muito grande, por isso não existe essa discussão, diferente do que acontece no Chile e na Europa onde o produtor briga mais na busca por seus direitos. No Chile os produtores são melhores remunerados por seus produtos. Esse negocio de vender mais barato que o custo de produção não existe por lá, como aconteceu com a laranja aqui, vender menor que o custo de produção só acontece no Brasil.

JPR:Fazer financiamento é arrumar uma bola de neve para o produtor?
José Fernando Pelo que tenho visto sim, pois ele agrava mais os preços baixos pago aos produtores. O governo do Estado lançou esses programas de financiamentos para tratores, plantadeiras e equipamentos. O que acontece, o produtor toma emprestado, daí tem que sair plantando adoidado, para poder pagar o financiamento, ele planta, produz, começa a entupir o mercado de produtos e o preço cai aí ele tem que trabalhar mais ainda. E muitos não conseguem pagar, por mais carência e juro zero que tenha. O fim disso será o pequeno vender a propriedade para o médio que vende para o grande, quando não cai na mão de especuladores para virar chácaras clandestinas.

JPR:Voltando na questão do milho, a remoção de pomares de laranjas, tem deixado terras ociosas, devido o produtor não ter certeza que uso dará a elas. É possível, nestas terras, plantar milho o ano inteiro?
José Fernando É possível o plantio durante o ano inteiro somente com irrigação, e no caso para milho verde, que tem melhor preço de mercado. A irrigação para o milho grão não é economicamente viável, a venda do grão não paga a irrigação. Mas na época das chuvas, é uma boa alternativa o plantio de milho nestas terras, para não ficar sem nada, enquanto eles decidem o que fazer. É interessante plantar milho, pois tem diversos usos como milho verde para consumo na culinária, para criação de galinhas e outros animais, tem a silagem e a venda do grão como renda. Mas é bom sempre considerar os custos para evitar gastar muito e não recuperar o dinheiro gasto.

[Matéria publicada originalmente na edição 124 do Jornal Pires Rural, 21/02/2013 - www.dospires.com.br]

 O agrônomo José Fernando Martins Borges





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